Na busca por esclarecer as origens das infecções por coronavírus em humanos, pesquisadores do Centro de Pesquisa em Bioinformática (BRC) da Universidade da Carolina do Norte (UNC) em Charlotte, Estados Unidos, realizaram umas das maiores e mais abrangentes análises evolutivas feitas até hoje. A equipe analisou mais de dois mil genomas de diversos coronavírus que infectam humanos ou outros animais.
O PhD brasileiro Denis Jacob Machado – principal autor do artigo – afirmou, em um texto liberado pela universidade, que as análises feitas pela comunidade científica logo após o surgimento do novo coronavírus foram apressadas e apresentaram diferentes problemas. O estudo organizado por sua equipe fez análises evolutivas com base nos padrões mais rigorosos da área.
"Muitas análises anteriores tiveram uma amostragem pobre em diversidade viral ou com ênfase excessiva na similaridade geral, ao invés de focar nas características compartilhadas devido à história evolutiva comum. Foi muito importante para nós evitar esses erros na produção de uma hipótese evolucionária sólida que ofereceria informações confiáveis para pesquisas futuras", disse Machado.
Coronavírus em humanos
A infecção por coronavírus (CoVs) em animais e humanos não é nenhuma novidade. Os primeiros artigos na literatura científica foram publicados em 1966. No entanto, antes dos surtos de SARS-CoV (síndrome respiratória aguda grave – ou Sars, ocorrido entre 2002 e 2003); MERS-CoV (síndrome respiratória do Oriente Médio, ativa desde 2012) e SARS-CoV-2 (causador da covid-19), muito pouca atenção havia sido dada aos coronavírus.
Mas de repente, os coronavírus mudaram tudo: desde conceitos de saúde pessoal e pública até os níveis de bem-estar social e econômico. Foi essa mudança levou a análises apressadas, que buscaram encontrar hospedeiros intermediários (por exemplo, a civeta no caso do SARS-CoV e o pangolim no SARS-CoV-2), ao invés de vigiar vírus semelhantes ao SARS em morcegos, o que, segundo o resultado da nova pesquisa, seria mais importante.
Conclusões científicas
A equipe de Machado atestou que os morcegos têm sido hospedeiros ancestrais de coronavírus humanos no caso do SARS-CoV e do SARS-CoV-2. Esses animais também foram os hospedeiros ancestrais de infecções por MERS-CoV em camelos dromedários – que migraram rapidamente para humanos.
A transmissão de MERS-CoV entre camelos e seus pastores ocorreu após o contato de morcegos com esses hospedeiros (os camelos). Da mesma forma, houve transmissão de SARS-CoV para humanos – primeiro entre vendedores de civetas – após o contato entre morcegos e civetas. Esses eventos são semelhantes à transmissão do SARS-CoV-2 entre criadores de visons e seus animais, mas essas infecções secundárias não tiveram relação com o surgimento dos coronavírus em humanos.
O estudo também confirma as origens dos hospedeiros animais de outros coronavírus humanos, como HCoV-NL63 (de hospedeiros morcegos), HCoV-229E (de hospedeiro camelo), HCoV-HKU1 (de hospedeiros roedores) e HCoV-OC43 e HECV-4408 (de vacas hospedeiras).
Os pesquisadores afirmam que a transmissão de coronavírus de animais para humanos ocorre episodicamente. De 1966 a 2020, cientistas descreveram oito linhagens de coronavírus hospedadas em humanos. Embora seja difícil prever quando um novo coronavírus assim poderá surgir, os dados indicam que devemos nos preparar para essa possibilidade.
"Como a transmissão entre animais e humanos ocorre em intervalos imprevisíveis, não é aconselhável esperar o momento em que experimentaremos o próximo coronavírus humano", afirmou o professor Daniel A. Janies, professor de Bioinformática e Genômica líder do estudo. "Devemos conduzir pesquisas sobre vírus que podem ser transferidos de animais para humanos de forma contínua, ao invés de apenas reagir quando um surto acontece", finalizou.
Há também quem acredite que o SARS-CoV-2 tenha escapado de um instituto de virologia que é líder mundial na pesquisa dos coronavírus, localizado em Wuhan, na China. O escritor Nicholas Wade, especializado em ciência, afirma em um texto no site Medium que a possibilidade não deveria ser tratada como conspiração, mas sim como um cenário possível – e que também deve ser analisado para que, caso a origem seja essa, outro caso semelhante não volte a ocorrer.