A vida acontece depois da vidraça, onde não há espectadores, mas atores. Essa foi a segunda importante descoberta da aposentada Anésia dos Santos, 64 anos. A primeira foi a do diagnóstico do câncer de mama, doença que mata uma mulher a cada 30 minutos no Brasil. Anésia venceu o câncer e, como prêmio, além da própria vida, conheceu o privilégio de se tornar avó.
Na sua luta pela vida, Anésia teve, entre os percalços, a demora para ser diagnosticada com a doença. “Em 2014, após vários desmaios, comecei a emagrecer, fui a vários médicos para descobrir a causa, fiz mamografia e nada foi descoberto”, lembra. Sofrimento como o de Anésia é o que se busca evitar através da campanha realizada neste mês, o Outubro Rosa.
A maior rapidez no diagnóstico está entre os principais objetivos da campanha, realizada mundialmente. Mato Grosso do Sul se integrou, efetivamente, a essa ação em 2014, quando os deputados estaduais aprovaram o projeto que se tornou a Lei 4.541.
Ao falar sobre a campanha, o deputado Paulo Corrêa (PSDB), presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS), enfatiza a importância do diagnóstico precoce. “Essa campanha, que é mundial, cumpre um papel importantíssimo ao chamar a atenção da sociedade sobre o diagnóstico precoce do câncer de mama. Algumas pesquisas apontam que as chances de cura passam de 90% quando os casos são identificados no estágio inicial da doença”, afirma o parlamentar.
As ações de enfrentamento ao câncer de mama passam pela imprescindibilidade do direito ao atendimento digno, conforme nota o presidente da Casa de Leis. “Ações de conscientização e prevenção são tão importantes quanto trabalhar por direitos e para que mais mulheres tenham acesso ao diagnóstico, atendimento médico e todo suporte necessário”, defende o deputado. E acrescenta: “Esta é uma das principais bandeiras desta Casa: assegurar atendimento digno e de qualidade a toda população”.
Um dos autores da Lei 4.541/2014, o deputado Zé Teixeira (DEM), 1º secretário da ALEMS, reforça a necessidade do diagnóstico precoce. “Oficializamos a campanha no Estado para servir como um alerta, porque hoje sabemos que, se for descoberto cedo, o câncer de mama pode ser revertido”, observa o parlamentar. Além de participar da elaboração da lei, Zé Teixeira atua, de modo intenso, através de panfletagens nas ruas e outras ações, na divulgação do movimento mundial chamado #OutubroRosa, que visa à conscientização sobre a prevenção do câncer de mama.
Essa atenção é fundamental, considerando a gravidade da doença, conforme mostram levantamentos do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Em 2018, último ano com dados de óbitos, morreram 17.572 mulheres com câncer de mama no Brasil. É o câncer que mais mata mulheres no país: a quantidade de 2018 representou 16,4% do total de mortes de brasileiras causadas por algum tipo de câncer.
As 17.572 mortes correspondem à média diária de 48 óbitos. Em maior detalhamento, a cada 30 minutos, uma mulher morre com câncer de mama no Brasil.
A estimativa do Inca é que em 2020, 66.280 mulheres sejam diagnosticadas com câncer de mama em todo o país. Em Mato Grosso do Sul, seriam 850 casos novos neste ano. Isso significa que, no Estado, todos os dias, duas mulheres, em média, passam por semelhante experiência de dor vivida por Anésia dos Santos.
Há seis anos, os deputados da ALEMS aprovaram Projeto de Lei 183/2013, que se tornou a Lei 4.541/2014. Além de Zé Teixeira, a proposta tem como autoras as ex-deputadas Dione Hashioka e Mara Caseiro.
De acordo com a lei, a campanha do Outubro Rosa objetiva a promoção da conscientização sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama, integração de ações de entidades públicas e privadas e a oportunização de trabalhos com a comunidade realizados por acadêmicos de graduação e voluntários.
A saúde é pauta constante na ALEMS. Em relação específica ao câncer de mama, os parlamentares aprovaram, em 2019, a Lei 5.332/2019, de autoria do deputado Barbosinha (DEM), que obriga hospitais, clínicas e consultórios a informar aos pacientes em tratamento de câncer que a reconstrução da mama é feita gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A lei determina que material informativo sobre este assunto deve ser afixado em locais de fácil visualização.
Além do trabalho estritamente parlamentar, a ALEMS também realiza campanhas, como arrecadação e doação de lenços e atendimento às servidoras da Casa. Em outubro do ano passado, a ação, proposta pelo deputado Felipe Orro (PSDB), atendeu 63 mulheres, da quais 35 passaram pela triagem de colo do útero e 28 pacientes na triagem de mama.
Em outubro de 2014, a Assembleia Legislativa recebeu iluminação rosa e Anésia, o diagnóstico positivo de câncer de mama. Era a oficialização, através da Lei 4.541, da adesão de Mato Grosso do Sul à campanha de prevenção à doença. Com a iluminação especial, a Casa de Leis chamava atenção da sociedade à necessidade de maior rapidez do diagnóstico do câncer de mama. Para Anésia, era o ingresso em nova etapa da vida ou, mais precisamente, da vida em sua nova etapa. Com a confirmação da doença, ela sentiu a angústia da demora dar lugar à certeza da luta pela vida.
“Desde a descoberta de que estamos com câncer até fazermos o tratamento e nos darmos conta de que a nossa vida mudou totalmente, é preciso tempo”, partilha Anésia sua experiência.
A demora no diagnóstico a angustiava, mas ela persistia. “Como não perdi a esperança de saber o que eu realmente tinha, fui a vários outros médicos. Fui parar no Hospital de Câncer de Barretos, aqui em Campo Grande. Lá, no primeiro contato com a médica que me atendeu, ao examinar, ela percebeu algo errado na mama”, lembra-se.
No processo todo, que Anésia prefere chamar de luta pela vida e não de luta contra o câncer, houve muito sofrimento, mas também muito carinho de amigos e familiares. Ela se lembra das dores da quimioterapia, da radioterapia e da imunoterapia, da baixa imunidade, das infecções, dos sangramentos e das corridas, de madrugada, ao hospital. Mas também se recorda dos abraços, dos apoios, das orações, do cuidado de amigas que lhe faziam sopinhas, chazinhos, lhe davam remédios e a maior das atenções: a presença.